Artigos Acadêmicos

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Local: Balneário Camboriú, Santa Catarina, Brazil

3/25/2007

O Cidadão Encarcerado é Passível de Recuperação?

O sistema prisional hoje no Brasil é um sistema falido. Com superlotações, sem condições mínimas de saúde, higiene, com ambientes diferenciados, que deveriam separar de acordo ao crime praticado, periculosidade, sexo e idade.

O sistema atual viola princípios básicos fundamentais da nossa CRFB/88, tais como os já citados anteriormente e, talvez o mais “gritante”, em nosso estado, atualmente é o fato de não haver defensoria pública, logo em seguida, é comum ver cidadãos sendo presos, sem conhecer seus direitos de manterem-se calados, ter assistência da família e de um advogado no primeiro instante e depois não é garantido o direito à liberdade e igualdade; que ninguém será submetido tratamento desumano ou degradante; garantia de dignidade à pessoa humana; integridade física e moral, entre outros.

Renata Ramos expõem o seguinte:

Inúmeras pesquisas e vistorias feitas por órgãos de defesa de direitos humanos nos estabelecimentos prisionais do Brasil revelam um quadro aviltante da condição humana a que são submetidos os encarcerados. Permanência na prisão além do tempo da condenação, ou no regime mais severo quando há a possibilidade de progressão. Violência oficial crônica exercida contra o preso, inclusive tortura, desde o momento em que é detido. Submissão a degradantes condições de vida nos presídios, cadeias e delegacias por ausência de condições mínimas de acomodações. Superlotação, sendo obrigados a dormir no chão, às vezes no banheiro próximo ao buraco de esgoto, ou amarrados às grades das celas, em estabelecimentos deteriorados. Ausência de assistência à saúde, permitindo que doenças como tuberculose e AIDS sejam epidêmicas. Não cumprimento da regra mínima que recomenda o limite de 500 presos por estabelecimento. Falta de ambientes diferenciados que propiciem a separação de acordo com o crime cometido, a pena aplicada, a periculosidade, o sexo e a idade dos apenados.

Anexo quadro evolutivo do Sistema Prisional Brasileiro, desenvolvido com base na obra “A prisão” de Luís Francisco Carvalho Filho.

1551 Historicamente fala-se na existência de um presídio em Salvador-Bahia (na época, sede do governo-geral do Brasil).
1808 No Rio de Janeiro é cedido pela Igreja, o Aljube (antigo cárcere eclesiástico do RJ), para servir de prisão comum após a chegada da Família Real.
1821 Decreto firmado pelo príncipe regente d.Pedro, marca o início da preocupação das autoridades com o estado das prisões no país.
1824 A constituição além de abolir o açoite, a tortura, marca de ferro quente... determinava que as cadeias fossem seguras, limpas e bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos réus, conforme suas circunstâncias e natureza dos crimes.
1829 Comissão de Inspeção nomeada pela Câmara Municipal do RJ preocupa-se com o aspecto dos presos e condições gerais do Aljube.
1830 É instituída pelo Código Criminal do Império a pena privativa de liberdade, deixando a pena de morte para os casos de homicídio, latrocínio e insurreição de escravos.
1890 O sistema ideal, para os propósitos de uma nação moderna, passa a ser o progressivo, formalmente adotado pelo Código republicano de 1890.
1920 É inaugurada a penitenciária de São Paulo, que ainda permanece em atividade, no bairro do Carandiru.
1940 É editado o Código Penal.
1956 É inaugurada a Casa de Detenção de São Paulo, também no Carandiru, símbolo da história das prisões brasileiras.
1977 1984 1989 Alterações importantes no Código Penal.
1992 Ocorre o “massacre dos 111 presos”, momento mais marcante da história da Casa de Detenção de São Paulo.
2002 Em março é desativada a Casa de Detenção de São Paulo.


As penas que restringem a liberdade, tira do cidadão um dos bens jurídicos mais importantes, onde o Estado retribui com uma sanção sob um ato ilícito, agindo assim, como uma função preventiva e que impedisse o autor de cometer novos delitos e reintegra-lo a socialmente. Só que na prática isto é parcialmente aplicado. O cidadão é excluído e fica recluso, mas onde trata de uma re-socialização, isso não é aplicado.

As cadeias e presídios são superlotados, não há atividades profissionais que possibilite aos presos novas possibilidades. Não há um exame de periculosidade e separação dos graus dos mesmos, o que acaba revoltando e tornando os menos “perigosos” em perigosos em potencial.

Na prática não é feito nem um estudo psicológico para a alteração de regime fechado para semi-aberto e sucessivamente.

Uma reinserção completa do cidadão encarcerado na sociedade não passa de mera utopia, uma vez que somos seres dotados de memória e que, como seres humanos sensíveis a mínimos estímulos (sejam negativos ou positivos), respondemos rapidamente aos mesmos, sendo o encarceramento um estímulo totalmente negativo ao cérebro de qualquer pessoa que venha a passar por tal experiência. (Ramos)

É impossível que um cidadão encarcerado no atual sistema brasileiro seja passível de recuperação, a tendência é de se tornar ainda pior, com delitos ainda maiores, sem nenhuma chance do lado de fora das penitenciárias.

A seguir, consta sentença, cuja decisão concede liberdade provisória de um preso, demonstrando assim que ao menos alguns juízes, apesar de não terem dúvidas quanto a autoria de um crime, neste caso de receptação, também tem noção da atual situação do sistema penitenciário. Devido a isso, é anexado aqui, sentença na íntegra, zelando pela integridade do réu, não identificando o número do processo e identificação do mesmo.


PROCESSO: ***
PEDIDO DE RELAXAMENTO DE PRISÃO
REQUERENTE: M. J. S.


D E C I S Ã O


Vistos etc.
Trata-se de pedido de liberdade provisória formulado por M.J. S., preso em flagrante delito, pela pratica, em tese, de receptação, fundado na primariedade, atividade lícita e endereço fixo, com parecer favorável do Ministério Público.
O crime em tese de receptação encontra-se comprovado no Auto de Prisão em Flagrante, pelo depoimento do condutor e das testemunhas, e é forçoso reconhecer que há indícios suficientes da autoria que lhe é atribuída, porém, é consabido que, “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança” (CF., art. 5.º, LXVI).
Também é certo que, inexistindo qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva – garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal – o Juiz, depois de ouvir o Ministério Público, pode conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação (CPP, art., 310, parágrafo único).
Por outro lado, é inegável que a crescente criminalidade nesta comarca e região, está a exigir uma atuação objetiva e concreta das autoridades públicas na sua prevenção e, principalmente, na repreensão a delinqüência, em todas as formas com que ela se manifeste, o que, somado a necessidade de se dar uma proteção social ampla, seria motivo suficiente para sua prisão preventiva, e indeferir o pedido de liberdade provisória, visando a garantia da ordem pública.
Todavia, diante da falência do sistema penitenciário brasileiro que nada re-socializa, da crescente consciência jurídica de que prisão, entendida como o enjaulamento do preso, seja como conseqüência de decisão cautelar, seja como conseqüência de sentença definitiva, somente deve ser decretada nos crimes de maior gravidade ou com violência ou grave ameaça contra a pessoa, com fulcro no art. 310, parágrafo único, combinado com o art. 312, do Código de Processo Penal, CONCEDO ao conseqüentemente, para Acusado o direito à liberdade provisória, mediante compromisso de comparecimento a todos os atos do processo, de não se mudar de residência ou dela se ausentar por mais de 8 (oito) dias, sem prévia permissão deste juízo ou comunicação do lugar onde será encontrado, sob pena de revogação.
Comunique-se a Autoridade Policial para que, incontinente, encaminhe o detento para assinar o Termo de Compromisso e citado nos autos principais. Lavre-se o Termo e expeça-se Alvará de Soltura, salvo se por outro motivo estiver preso.
Translade-se cópia da presente decisão para os autos principais, desapensem-se os autos e arquivem-se, anotando-se as devidas baixas.
Intimem-se e cumpra-se.
Camboriú (SC), 01 de fevereiro de 2007

CAROLINE BÜNDCHEN FELISBINO
Juíza Substituta
(www.tj.sc.gov.br)

No período de reclusão, onde os presos mantêm-se enjaulados, ocorre a morte moral do ser humano, os traumas são claros, mesmo que cada um reaja de forma diferente, é muito difícil a reação de forma positiva diante de tanta desumanidade, humilhação e sobrevivência indigna.

JOÃO FARIA JÚNIOR, demonstrando grande conhecimento sobre a situação de crise nas prisões, nos indica os principais males que assolam o sistema penitenciário brasileiro:

1- A ociosidade - dos 100.000 presos do Brasil, apenas 5% trabalham.
2- Irrisória remuneração, não obstante o mínimo de ¾ determinada pela LEP.
3- A superlotação - a falta de vagas ultrapassa a marca dos 50 mil, sem contar os mais de 300 mil mandados de prisão não cumpridos. A superlotação é a principal causa das rebeliões nas prisões.
4- A promiscuidade - é conseqüência da superlotação, por se reunirem numa mesma cela um amontoado de pessoas das mais variadas espécies.
5- A formação de grupos mafiosos que são comandados por lideres que exercem poder de dominação sobre os demais presos, com objetivo de adquirir armas, bancar o jogo de azar, tráfico de drogas, tabaco e álcool, cobrar por proteção e violentar sexualmente outros presos.
6- Fugas, motins , greves, violência, privilégios de certos presos e discriminação de outros, corrupção dos funcionário, falta de capacidade administrativa para gerenciar o estabelecimento prisional, falta de verbas, etc.

Enquanto não for alterada a forma com que nossos governantes lidem com esta situação, é pouco provável que algo de diferente aconteça. Existe uma falsa impressão de que a sociedade também tenha segurança, quando na realidade, com as super-lotações, a tendência a motins, rebeliões, é muito grande, colocando a vida dos que estão reclusos e dos que estão ao lado de fora estejam seguras.

As alterações são feitas somente quando o pior acontece. Os presos são deixados de lado pela sociedade em geral, mas completamente esquecidos pelos nossos governantes. Presos não dão votos nas eleições, então, ao invés de investir-se em mais presídios, funcionários, tratamento mais humano e conseqüentemente mais segurança. Continuam investindo em praças públicas, enfeitando as cidades e estados, que aos olhos dos cidadãos comuns, que também não se preocupam com este sistema e têm a “falsa” impressão de segurança, tudo parece mais bonito...

Mera ilusão... enquanto isso, a sociedade cria mais delinqüentes e depois os esconde... Recuperação dos presos e da sociedade em geral é mera utopia... As leis são bonitas e pouco aplicadas... Vivemos entre um palácio e um casebre! Talvez tudo isso na prática não passe de belas poesias.


A sociedade prepara o crime,
o criminoso o comete”.

BIBLIOGRAFIA:

FARIA JÚNIOR, João. Manual de criminologia. Curitiba: Juruá. 2a edição, 1996.

COSTA LEITE, Paulo Roberto Saraiva da. Sistema Penitenciário: Verdades e Mentiras. Site: http://www.cjf.gov.br/revista/numero15/abertura.pdf. Acesso em 13 de março de 2007.

RAMOS, Renata. A Recuperação do Cidadão Encarcerado. Site: http://www.apriori.com.br/cgi/for/viewtopic.php?p=2589.

CARVALHO FILHO, Luís Francisco. A Prisão. São Paulo: Folha Explica. 1ª edição, 2002.

FELISBINO, Caroline Bündchen. Decisão Judicial que Concede Liberdade Provisória. Camboriú: Site: http:/www.tj.sc.gov.Br. Acessado em 24 de março de 2007.